Alta na renda eleva confiança do consumidor e aumenta o número de famílias endividadas

Após o encolhimento da renda e do total de rendimentos ao longo da recessão econômica que atingiu o País entre os anos de 2014 e 2016, uma reação foi notada no ano passado. Em dezembro de 2017, o rendimento total das famílias brasileiras atingiu R$ 277,9 bilhões no mês, alta real de 5,5% em relação aos R$ 263,3 bilhões apurados em dezembro de 2015, ou seja, um aumento de R$ 14,6 bilhões. Considerando a elevação de 1,6% no número total de famílias nesse mesmo período, a renda média mensal familiar passou de R$ 4.250,37 para R$ 4.416,95, elevação de 3,9%, portanto.

Os dados compõem a oitava edição da Radiografia do Endividamento das Famílias Brasileiras, realizada pela Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP). O estudo avalia os principais aspectos, dimensões e efeitos da política de crédito no Brasil sobre as famílias entre 2015 e 2017, período transitório, com encerramento da crise econômica (2014/2016) e início de um processo de recuperação em meio às incertezas políticas e econômicas. A análise foi feita com base em informações do Banco Central do Brasil, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).

Segundo a assessoria econômica da FecomercioSP, a combinação de três fatores explica essa recomposição da renda. O primeiro deles é a forte queda da inflação no período, que passou de 10,67% em 2015 para 2,95% em 2017, produzindo o chamado efeito-renda, que ocorre quando os salários são reajustados por uma taxa passada muito acima da inflação corrente. O segundo é o avanço na taxa de ocupação, ainda que de forma bastante gradual e concentrada no mercado informal, após um período de elevação abrupta do desemprego e, finalmente, o aumento na massa de rendimentos dos aposentados, pela combinação da elevação dos inativos e do aumento do benefício médio.

Comportamento semelhante foi observado no conjunto das capitais brasileiras – foco do estudo – embora de forma menos intensa, já que a massa de rendimentos das famílias cresceu 4,8% e a renda média mensal avançou 3,2% entre dezembro de 2015 e o final de 2017, enquanto o número de famílias também se elevou em 1,6%.

Essa alta na renda das famílias foi decisiva para a mudança na trajetória do ritmo das atividades internas, permitindo a interrupção do ciclo recessivo do consumo iniciado em 2014 e alavancando o nível de confiança das famílias, fator essencial para a retomada que se observou nas operações de crédito no país. Assim, a proporção de famílias endividadas no conjunto das capitais brasileiras passou de 59% em dezembro de 2016 para 62,2% no final de 2017. Isso significa um aumento de 540 mil no número de famílias com algum tipo de dívida, alcançando 9,7 milhões em dezembro do ano passado.

A parcela de famílias com alguma conta em atraso também subiu nesse período, de 24% no fim de 2016 para 25,7% em dezembro de 2017. Entretanto, a elevação da renda no período permitiu que, mesmo com essas altas no endividamento e na inadimplência, o comprometimento mensal da renda com dívidas se mantivesse estável entre 2016 e 2017, na casa de 30%. Esse número permaneceu estatisticamente estável pelo sétimo ano consecutivo, aponta o estudo da FecomercioSP.

Ainda de acordo com a Entidade, a manutenção do patamar conservador de comprometimento da renda com dívidas fez com que o nível de inadimplência permanecesse em patamares aceitáveis.

Juros

A recessão iniciada em 2014 produziu uma queda acumulada de 18% nas vendas varejistas no Brasil, fazendo o setor retroceder aos níveis de faturamento de cinco anos atrás. Independente da intenção de consumo das famílias, a recuperação do setor deverá demandar um longo tempo, dependendo essencialmente das condições futuras da renda, do emprego, da inflação e do crédito, avalia a Federação.

O nível de acessibilidade ao crédito tem importante papel nesse processo e passa necessariamente pela prática de um padrão de taxa de juros bem menor do que o atual. Os custos dos empréstimos no Brasil são cronicamente elevados e isso é decisivo para impedir esse objetivo de torná-lo um instrumento cada vez mais importante para o crescimento econômico interno. Os juros altos elevam os custos das dívidas e o valor das parcelas.

Um estudo realizado recentemente pela Federação apontou que o valor dos juros pagos pelas famílias no Brasil em 2017 chegou a R$ 355 bilhões, valor equivalente a quase 11% de toda a sua renda anual. Assim, o dinheiro que seria destinado ao consumo passa a ser direcionado ao setor financeiro que faz a intermediação legítima de recursos entre poupadores e tomadores. Como o governo é o maior tomador de dinheiro, os poucos recursos que sobram são muito disputados. Essa disputa faz com que as taxas médias de juros para os consumidores atinjam patamares inacessíveis à maioria da população.

Dessa forma, é preciso que o governo produza uma administração adequada das contas públicas, por meio de um projeto de redimensionamento de seus gastos que permita reduzir sua pressão no mercado de crédito e, por consequência, reduzir o custo do dinheiro.

Destaque nas capitais

Mais uma vez, Curitiba/PR foi a capital com o maior porcentual de famílias endividadas (91%) em dezembro de 2017, quatro pontos porcentuais (p.p.) a mais do que no mesmo mês do ano anterior. A cidade paranaense registrou uma dívida média mensal por família de R$ 2.452 em dezembro de 2017, valor 2,6% maior que aquele registrado no final de 2016 e a terceira maior cifra entre as capitais. Além disso, Curitiba também tem o quarto maior número de famílias endividadas do país (572,8 mil).

Embora ainda permaneça em patamares elevados, a parcela de famílias endividadas em Florianópolis/SC recuou 6 p.p. ao passar de 86% em dezembro de 2016 para 80% no mesmo mês de 2017 e, com isso, caiu do segundo lugar nesse ranking, que ocupava seguidamente nos últimos anos, para o terceiro. A segunda posição é ocupada agora por Boa Vista/RR, com 83% das famílias endividadas. Os quartos e quintos lugares ficaram com Natal/RN e Brasília/DF, ambas com uma taxa de 79%.

Goiânia/GO é a capital com a menor taxa de famílias endividadas do país, com apenas 38%, seguida por Belém/PA com 40%, ambas muito abaixo da média nacional de 62%. Em terceiro lugar aparece Salvador/BA, com 51% das famílias com algum tipo de dívida. Em quarto e quinto estão Porto Velho/RO e Teresina/PI, as duas com 52%.

Três das cinco capitais em que as famílias apresentam as maiores taxas de comprometimento da renda com dívidas estão localizadas nas regiões Norte e Nordeste. São elas: Teresina/PI, Boa Vista/RR, ambas com 43% – em primeiro e segundo lugar; e Fortaleza/CE (34%), em quinto lugar. De acordo com a Federação, essas são justamente as regiões onde a oferta de crédito formal mostra as maiores desproporções em relação à população.

Nos casos de Belo Horizonte/MG (40%), a terceira no ranking; e de Brasília/DF (35%), quarto lugar no mesmo levantamento; esses índices têm menor gravidade, dado o maior nível de renda dessas capitais que acaba por ser a causa desse comprometimento acima da média nacional. As cinco capitais com menores taxas de comprometimento da renda são: João Pessoa/PB (11%); Belém/PA (13%); Vitória/ES (21%); Cuiabá/MT (24%) e Aracaju/SE (25%).

Em relação ao valor total da dívida mensal das famílias, São Paulo/SP lidera o ranking, uma vez que tem a maior população do país. Em dezembro de 2017, esse montante alcançou R$ 5,1 bilhões mensais, alta significativa de 13% em relação a dezembro de 2016, motivada pelo aumento da parcela de famílias endividadas, que foi de 52% para 56% nesse mesmo período, o que representa um incremento de mais de 183 mil novas famílias paulistanas endividadas. Na sequência, aparecem: Rio de Janeiro/RJ, com R$ 2,3 bilhões mensais; Brasília/DF, com R$ 1,9 bilhão por mês; Belo Horizonte/MG e Curitiba/PR com R$ 1,6 bilhão e R$ 1,4 bilhão, respectivamente.

Em contrapartida, João Pessoa/PB é a capital com menor valor total da dívida mensal das famílias: R$ 95,5 milhões. Completando a lista, seguem: Belém/PA (R$ 97,4 milhões); Palmas/TO (R$ 107,4 milhões); Rio Branco/AC (R$ 113,2 milhões); e Porto Velho/RO (113,7 milhões).

No caso do valor médio mensal de dívidas por família, a capital no topo da lista é Belo Horizonte/MG, com R$ 2.766. Em seguida, vem Brasília/DF, com R$ 2.635; Curitiba/PR, com R$ 2.452; São Paulo/SP, com R$ 2.358; e Boa Vista/RR, com R$ 2.224. Por outro lado, as famílias da capital do Pará têm o menor valor médio de dívida por família, de R$ 623. Seguem no ranking das cinco cidades João Pessoa/PB (R$ 680); Maceió/AL (R$ 909); São Luís/MA (R$ 1.210); e Cuiabá/MT (R$ 1.266).

Por fim, Vitória/ES é a capital com a maior proporção de famílias com contas em atraso, 49%. Em seguida, vem Porto Alegre/RS (46%); Macapá/AP (43%); Boa Vista/RR (42%); e Manaus/AM (38%). As capitais com menores taxas de inadimplência são: João Pessoa/PB (5%); Brasília/DF (11%); Porto Velho/RO (13%); Palmas/TO (13%); e Teresina/PI (14%).